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O Castelo de Aljezur localiza-se sobre uma elevação destacada na paisagem, de onde se domina, para leste, a fértil várzea da Ribeira de Aljezur; a escassos quilómetros, para oeste, a vista alcança o litoral, a que se tinha fácil acesso fluvial até pelo menos ao século XVI. A estas características topográficas e de envolvência próxima acresce uma favorável posição no corredor de circulação entre o Alentejo litoral e o Barlavento Algarvio.
Provavelmente em resultado das boas condições geoestratégicas, o lugar foi, recorrentemente, ocupado em períodos marcados por acentuada instabilidade sociopolítica. Nele se enraízam as origens da vila actual, justamente coroada pelo emblemático castelo e desdobrada ao ritmo do declive das encostas que descem para a várzea, com as suas casas térreas de telhados de uma só água.
As escavações arqueológicas realizadas durante a última década pela Unidade de Arqueologia do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, de colaboração com a Câmara Municipal de Aljezur e sob direcção de Carlos Tavares da Silva, deram a conhecer as ocupações humanas ocorridas na colina do Castelo de Aljezur. Esses trabalhos revelaram uma sequência de níveis arqueológicos, contendo testemunhos do final da Idade do Bronze, com cerca de três mil anos; da II Idade do ferro - período romano-republicano, entre o século IV e o século I a.C.; dos períodos muçulmano, medieval cristão e transição para a Idade Moderna (séculos XV-XVI), fase em que o local é definitivamente abandonado. A informação disponível sobre as ocupações mais antigas da colina do castelo é muito escassa. A fase respeitante ao final da Idade do Bronze está representada por materiais cerâmicos conservados em nível pouco espesso e descontínuo, assente sobre o substrato rochoso. O espólio arqueológico da Idade do Ferro e do período romano-republicano evidencia filiação mediterrânea. A par de produções locais/regionais, identificaram-se produtos importados, provavelmente de origem itálica, como cerâmicas finas de mesa, de engobe negro e lustroso, de tipo campaniense, e ânforas vinárias, dos séculos II-I a. C.
Os níveis correspondentes à Idade do Ferro e ao período romano-republicano sofreram intensa erosão durante a fase de abandono que antecedeu a chegada de populações muçulmanas.
O período muçulmano
No que se refere ao período muçulmano, os trabalhos detectaram duas fases de ocupação. Da primeira fase foram postas a descoberto paredes, cuja parte superior seria constituída por taipa, pertencentes a habitações, com pisos, por vezes, lajeados. A fortificação actualmente existente parece remontar ao início da segunda fase do período almóada (séculos XII-XIII), quando foram construídas as muralhas actualmente existentes. Faria parte do sistema defensivo do território de Silves, que se estendia desde os actuais concelhos de Lagoa e Albufeira até Aljezur e sul do litoral alentejano.
O Castelo de Aljezur apresenta planta poligonal, com a entrada virada a nascente, defendida por bastião de planta circular. No extremo oposto foi edificada uma torre de planta rectangular. No interior da fortificação observa-se uma cisterna (algibe) de planta rectangular e cuidada construção. Foram ainda descobertos silos escavados na rocha, que permitem atribuir a este recinto fortificado funções de armazenamento, provavelmente colectivo. A dieta da população muçulmana que aí habitou mostrou-se muito diversificada, estando presentes abundantes restos de mamíferos domésticos e selvagens, como o veado, de peixes e de marisco (numerosas conchas de moluscos marinhos e estuarinos). Estes dados permitem supor que a economia assentava na agropecuária e na pesca, complementada pela caça e recolecção de marisco. Outras actividades económicas de carácter artesanal, como a metalurgia do ferro, representada por escórias de fundição, foram também praticadas pelos residentes do castelo.
A pequena fortificação muçulmana de Aljezur viria a cair na posse dos Cristãos, no reinado de D. Afonso III, em resultado de investida comandada pelo Mestre da Ordem de Santiago, D. Paio Peres Correia, nos anos 40 do século XIII.
A conquista: lendas e factos
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Depois da conquista cristã
Durante o período pós-muçulmano foram edificados, ao longo e encostados às muralhas, compartimentos de planta rectangular e trapezoidal, correspondentes a provável aquartelemanto. O Castelo de Aljezur terá, então, detido funções essencialmente militares. O seu abandono definitivo ocorreu no início da Idade Moderna. As cerâmicas que surgiram no topo do enchimento das estruturas atrás referidas, em contexto de lixeira, são atribuíveis aos finais do século XV/século XVI. A informação escrita constante da Visitação da Ordem de Santiago a Aljezur, em 1482, cita expressamente o castelo, o qual estaria já abandonado e parcialmente arruinado (pano ocidental do amuralhado). As portas sem fechadura e, parcialmente, quebradas. É, aliás, notória a preocupação quanto à necessidade de reconstrução do troço de muralha em ruínas, da limpeza da cisterna onde vinha sendo acumulado lixo e entulho.
Texto de Joaquina Soares, Museu de Arqueologia e Etnografia do distrito de Setúbal, editado pelo IPPAR (desdobrável "Guia Castelo de Aljezur", Dezembro de 2001)
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