Projectos urbanísticos nulos?
O Público revela que o Ministério do Ambiente remeteu para o Ministério Públcio a análise da nulidade de decisões das Câmaras Municipais de Vila do Bispo e Aljezur, queautorizaram construções que acrescentariam 16 mil camas à região, violando as regras do Parque Natural do sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. Haverá coragem política para travar a aberração?
"Vale da Telha é um dos oito empreendimentos nos concelhos de Aljezur e Vila do Bispo cujo alvará vai ser analisado pelo Ministério Público, podendo vir a ser declarado nulo por violação das regras do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. Estes casos - que abrangem 16 mil camas - foram encaminhados, na semana passada, pelo Ministério do Ambiente para os procuradores, para que seja interposta acção junto do Tribunal Administrativo. Os empreendimentos têm alvarás anteriores à criação da área protegida. O problema, invocado pelo Ambiente, é que estas autorizações foram renovadas pelas duas autarquias já depois de estar em vigor o Plano de Ordenamento do Parque, cuja carta de gestão não permite os índices de construção propostos pelos promotores. Segundo o despacho da Secretaria de Estado do Ambiente, a que o PÚBLICO teve acesso, pretende-se que seja interposta "acção administrativa especial com vista à declaração de nulidade dos alvarás dos loteamentos de Vila Rosalinda, Espartal e Vale da Telha localizados no município de Aljezur e que prevêem 11.543 camas - sendo que o actual número de habitantes desse concelho é de 5288 - e dos alvarás dos loteamentos de Esparregueiras, Martinhal, Caminho do Infante, Ecomave e Ecotual (Quinta da Fortaleza) localizados no município de Vila do Bispo e que prevêem 5140 camas - sendo que o actual número de habitantes desse concelho é de 5349". Alguns destes empreendimentos estão em pleno desenvolvimento e o secretário de Estado cessante, Jorge Moreira da Silva, gostaria que, ao mesmo tempo que o tribunal analisa a validade dos alvarás, fossem embargadas as obras para "evitar a consolidação do erro". Mas essa decisão só poderia ter sido tomada pelo ministro do Ambiente, Luís Nobre Guedes. Porém, este último preferiu deixar as medidas a tomar ao critério do seu sucessor, Francisco Nunes Correia. Os dois concelhos abrangidos foram investigados pela Inspecção-Geral da Administração do Território. No caso de Aljezur, cujo parecer já está concluído, os inspectores comprovaram que se levantavam dúvidas em relação aos alvarás. Sobre Vila do Bispo, ainda não são conhecidos os resultados, mas Moreira da Silva considerou que não era necessário esperar por estas conclusões para avançar com o pedido de nulidade dos alvarás. "A inspecção deve apurar quem, como e porquê, mas para declarar que os alvarás são nulos é necessária uma acção do Ministério Público e estes dois processos podem concorrer paralelamente", considerou o secretário de Estado. A convicção de que os alvarás são nulos é consubstanciada em diversas informações do Instituto de Conservação da Natureza (ICN), que alerta há anos para a situação. Segundo este organismo, "todas as renovações de licenças respeitantes a [estes] loteamentos (bem como todas as subsequentes licenças de construção), emitidas pelas câmaras municipais de Aljezur e de Vila do Bispo, são nulas - pelo menos quanto às emitidas após 1995, data da entrada em vigor do Plano de Ordenamento do Parque, com fundamento, precisamente, na falta das correspondentes autorizações da Comissão Directiva do Parque e no incumprimento dos critérios de edificabilidade estabelecidos naquele plano". Resta agora esperar pela decisão do Tribunal Administrativo e também pela filosofia que o novo ministro irá assumir em relação a esta e outras situações idênticas que ocorrem em diversos parques. Segundo um levantamento feito pelo ICN, as áreas protegidas em Portugal continental têm 3241 edificações clandestinas, das quais 100 já têm ordem de demolição. Se a decisão for pela nulidade dos alvarás, poderá dar origem a pedidos de indemnização. O PÚBLICO tentou, sem sucesso, contactar os dois presidentes das câmaras envolvidas. "
Ana Fernandes in Publico, 9 de março 2005
09-03-2005
|